27 de outubro de 2008

Essa

Essa eu não entendi. O que leva alguém a pichar "Fora Bush" numa esquina da Avenida Santo Amaro com uma rua qualquer de Moema (seria a Graúna? ou a "Inhambu?" Existe a Inhambu? É legal?), no muro de um escritório de advocacia meio caído (imagino que deve ser meio caído, afinal fica numa esquina da Santo Amaro, a única coisa que dá certo na Santo Amaro é auto-mecânica e botequim).
Mas voltando ao tema. É plenamente compreensível que a popularidade do presidente Bush esteja em baixa junto a segmentos da população que costumam pichar esquinas das avenidas da Zona Sul de São Paulo - Bush deve ser no momento impopular junto a quase todos os segmentos da população do mundo, independente dos respectivos hábitos de pichação. Também é natural que pichadores concentrem seus esforços em mensagens de protesto, deixando manifestações de apoio ou encorajamento para mídias menos reprimidas pelas forças policiais.
Mas nada disso explica a motivação por trás da pichação. Primeiro, não está claro da onde se quer expulsar o Bush. A região de Brooklin/Moema fica a milhares de quilômetros fora da fronteira americana. Se a moçada quer mesmo protestar contra as políticas do governo americano, que vá pichar os muros perto da Casa Branca ou que seja do rancho particular de W. em Crawford, Texas.
Mais que isso, a probabilidade de que alguma pessoa com poder de mover um processo de impeachment contra o presidente dos Estados Unidos costume passar diariamente pela Santo Amaro (sentido bairro-centro) é menor do que achar armas de destruição em massa no Iraque. Mesmo que algum congressista norte-americano, por remoto acaso, use a Santo Amaro de carro, moto ou ônibus no seu transaldo casa/trabalho/facul/casa da namorada (!!), é improvável que ele elencasse a prerrogativa constitucional de questionar o chefe de governo do executivo estadunidense e abalar a distribuição a separação de poderes em curso há dois séculos por causa da influência de uma manifestação gráfica feita com tinta spray numa metrópole da América Latina. O fato da letra "O" de "fora" ter uma linha vertical no meio (para dar um aspecto gótico? nórdico??) não aumenta em nada o poder de persuasão da mensagem.
(Não deixa de ser intrigante que os pichadores não dediquem sua energia contestatória a alvos mais próximos. Por que ninguém picha "Fora Lula"? Seria pelo menos um pouco mais pertinente no sentido geopolítico.)
A verdadeira questão do piche (que muita gente prefere denominar "grafite" e tratar como uma "forma de arte") é sua relação complicada com a democracia. Bush, para todos os efeitos, foi eleito democraticamente duas vezes, e terá seu mandato encerrado em poucos meses, quando será escolhido seu sucessor pela população dos EUA através dos colégios eleitorais. Se alguém quer participar do processo, é só se tornar um cidadão daquele país, e comparacer à votação no começo de novembro. (Nem precisa viajar até os EUA, ao contrário dos eleitores brasileiros, eles podem votar no consulado/pelo correio). Para mim, parece um procedimento muito mais saudável do que sorrateiramente começar a impor palavras de ordem nos espaços públicos de uso coletivo.
Essa questão de "Fora Bush" pode parecer inconseqüente, mas não é. Basta lembrar dez anos atrás, quando os baderneiros preferiam clamar por "Fora FHC", desrepeitando a ordem institucional e a vontade legítima da maioria. FHC cumpriu seu mandato, e foi embora para casa (no Higienópolis, longe da Santo Amaro). A turma da pichação sorrateira e autoritária continua aí.

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